quinta-feira, 9 de março de 2017

APENAS MAIS UM DIA

UM DIA
Vânia de Farias.

Há poucos dias, alguém flagrou o ator brasileiro Mario Gomes vendendo sanduíches e batatinhas, numa praia carioca. A cena correu o país, através das redes sociais.
Uns alarmados, uma vez que o ator havia feito inúmeros filmes, e ainda muitas telenovelas na emissora de TV, mais popular do país.
Outros, comentavam que não havia motivos para especulação, uma vez que o mesmo aos 65 anos de idade, ainda tinha força e coragem para trabalhar, o que seria um privilégio, no entender deles.
Se levarmos em consideração, ter sido o ator, um galã das telenovelas de uma das emissoras mais vista do país, esperava-se que estivesse hoje usufruindo dos frutos de seu antigo sucesso, entretanto sabemos que a vida não funciona de forma tão lógica e linear, e o ator foi alvo de um comentário odioso em relação a sua reputação, que teria prejudicado sua carreira. E temos notícias de muitos outros atores e atrizes, terminarem seus dias de vida completamente abandonados, pelos próprios familiares, amigos e colegas de profissão- imaginem de seu público- que costuma ser volátil e volúvel.
Refletindo sobre o assunto, veio a minha memória o garoto João Vitor, que aos 13 anos fora espancado até a morte, por dois funcionários de uma lanchonete no estado de S. Paulo.
Ironicamente, o próprio nome João, é hoje denominação para os milhões de brasileiros que vivem a margem da sociedade, sobrevivendo das sobras, restos de comidas, jogadas por restaurantes e lanchonetes, ou mesmo de domicílios residenciais, os conhecidos Joãos-ninguém.
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João-ninguém é uma expressão popular que define um
homem sem importância; pessoa insignificante.
Segundo o Dicionário Caldas Aulete, 1. Aquele que é considerado sem valor por não ter instrução, prestígio social, dinheiro; indivíduo insignificante, sem importância; ZÉ-NINGUÉM; POBRE-DIABO; BANGALAFUMENGA; PÉ-RAPADO.
Em OsDicionários.com. é o Indivíduo insignificante, sem importância; sujeito à toa. [Sin.: joão-fernandes, badameco, badana, bangalafumenga, beldroegas, berdamerda, beré-beré, bicho-careta, borra-botas, brochote, bunda, bunda-suja, fabiano, fubica, futrica, gato-pingado, janistroques, lagalhé ou leguelhé, lheguelhé, maenga, mequetrefe, ningres-ningres, zé dos anzóis, zé dos anzóis carapuça, zé da véstia, zé-prequeté.
Começo a imaginar os milhões de Joãos-ninguém que são humilhados, queimados, crucificados - não em sentido figurado- assassinados e abandonados, ou mesmo enterrados em covas rasas, que sequer tiveram direito a um dia. Sim, apenas um dia, para, mesmo enfrentando todos os impedimentos, legais, sociais, materiais e morais, pudessem viver, vendendo cachorro-quente, ou batatinha... trabalhando nas construções, ou nas cozinhas dos mais abastados, comendo e vestindo as sobras doadas pelos patrões.
Será que os Joãos-niguém, alcançados pelos golpes certeiros dos anjos da morte, que hoje, assolam o nosso país, não desejavam ter mais um dia ou mais um ano, uma década, para regar a plantinha da esperança de uma vida melhor?
E mais, será que esses anjos da morte, ainda não sabem que também são Joãos-ninguém? Que a elite soberba não precisa sujar as mãos com o sangue desses menores, já que dispõem de milhares de pares de mãos para vestirem luvas de sangue e após, ostentarem a desculpa que estavam apenas cumprindo ordens.
João Pessoa, março de 2017

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